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Drive to Survive: a terceira temporada, suas narrativas caóticas e personagens

Séries são capazes de mudar a percepção das pessoas ou validar alguns gostos. Quem se apaixona por uma série acaba entrando em mundo que vai além das telas, deixa se apoderar por algumas paixões.

Drive to Survive foi uma série que pegou pessoas que nem gostavam de automobilismo, mas passaram a se interessar pelo esporte ao compreenderem que uma corrida vai além das pistas. Nesta última sexta-feira (19) a terceira temporada de DTS foi disponibilizada pela Netflix e várias pessoas correram para saber o que aconteceu nos bastidores de 2020.  

Limitados pela pandemia, a Netflix ainda fez um bom trabalho, aproveitando os recursos que tinha em mãos para contar as histórias que fizeram parte do campeonato.

Por mais que alguns não considerem o automobilismo um esporte – já que se mede o desempenho do carro – ainda estamos falando sobre pessoas que estão guiando-os. A série desde a primeira temporada se propôs contar a história destes personagens, mostrar pilotos e equipes e os seus relacionamentos, os conflitos que acontecem dentro das pistas (em alguns momentos até fantasia alguns conflitos), mas o que é levado para os seus bastidores e o clima que acaba esquentando por lá.

Spoilers – Alguns pontos sobre a terceira temporada

Para aqueles que estão longe dos paddocks, mas queriam saber mais, a Netflix adentrou a portas que geralmente só forneciam aos espectadores e jornalistas o que eles queriam. No entanto nesta terceira temporada vemos que a Netflix não é mais uma novidade, e agora muitos já ficam mais atentos com o que vão falar perto das câmeras, afinal estes personagens já estão a muito tempo treinado para elas.

Sem muitas pessoas circulando pelo paddock por conta da pandemia, eles não conseguem mais se camuflar tão bem. Em 2020 a turma da Netflix também precisou ser parte dos times, sendo validados como membros das equipes para seguir fazendo a sua produção.

São 10 episódios, tivemos 17 corridas, obviamente muita coisa ficou de fora e claro que para nós que gostamos muito de F1, as narrativas da Netflix acabam sendo falhas em alguns momentos. Lewis Hamilton, o piloto com sete títulos mundiais ganha algum destaque ‘maior’ nos minutos que encerram o episódio do final da temporada, é somente naquele momento que falam sobre o fato do piloto vencer, vencer e vencer, mas também aproveitam para mencionar o racismo e a importância de Hamilton nestas lutas – algo que poderia ser bem mais explorado pela produtora. Como ele pode ser o único piloto negro na Fórmula 1?

Lewis Hamilton – Foto: reprodução

Por outro lado, eles não exploram a imagem do inglês, ele ter se tornando o maior vencedor da história da F1, marca atingida durante o GP de Portugal, ou o fato de ter se igualado ao número de títulos de Michael Schumacher no GP da Turquia. A única menção ao GP turco se dá quando Mick Schumacher é mostrado entregando o capacete do pai ao novo heptacampeão mundial.

A passagem de Nico Hulkenberg pelo grid da F1 substituindo pilotos que foram contaminados pelo Covid-19, ou a corrida complicada que George Russell teve em Sakhir, são coisas que passam batidas pela narrativa da Netflix neste ano. Desta forma é difícil dizer que foi uma série completamente redonda.

No entanto, ainda nos primeiros episódios eles mencionam o quanto o dinheiro é importante para a categoria e para as equipes, e como eles estavam dispostos a retomar as corridas mesmo com a pandemia acontecendo. O choque do cancelamento do GP da Austrália ou como eles receberam aquela notícia e o pânico por se algo muito novo, é bem abordado por aqueles que circularam no paddock naquele momento.

Os Personagens

Desde a segunda temporada a produtora da série ficou atraída por personagens, deu destaque ao chefe de equipe da Haas, Guenther Steiner, assim como para o chefe de equipe da Red Bull, Christian Horner. Os pilotos destas equipes voltam a ser mencionados outras vezes já que na Haas ele não vão ter o contrato renovado para 2021, enquanto o time austríaco não sabe muito bem lidar com Alexander Albon, vivendo entre a dualidade de acreditar no piloto, enquanto sabe que não poderá derrotar a Mercedes se ele não entregar o seu desempenho.

Mas Daniel Ricciardo e Cyril Abiteboul, a Scuderia Ferrari com Charles Leclerc e Sebastian Vettel e a McLaren com Carlos Sainz e Lando Norris voltam a aparecer na terceira temporada trazendo à tona os seus dilemas.

Senti que em alguns momentos os episódios parecem ser únicos por conta dos destaques que alguns personagens acabam ganhando: a Netflix aborda a saída de Ricciardo do time, a necessidade do piloto se manter inteiro para entregar os resultados, mas também se apega ao semblante fragilizado de Cyril Abiteboul com a saída do australiano.

Cyril Abiteboul – Imagem reprodução

Na Ferrari o dilema é outro, eles conseguem se ater a crise que a Ferrari estava vivendo, um time que não tinha tempo para piadas. Vettel que já é um piloto que tenho grande admiração não se importa mais em ser contido, despeja comentários e olhares afrontosos que falam muito sobre o ano difícil que passou com o time italiano.

A dupla da Ferrari no mesmo dia que Vettel confirma que está seguindo para a Aston Martin em 2021 – Foto: reprodução

Lawrence Stroll um importante empresário, responsável pela recuperação da Racing Point, mas do retorno da Aston Martin para a Fórmula 1, também ganha espaço de tela. A Netflix aproveitou a curiosidade que a sua imagem acaba gerando para trazer ele mais para perto e entender a sua visão sobre o esporte, mas o quanto o canadense também se deixou ser envolvido pelo automobilismo, já que além de negócio, também é a sua paixão.

Expectativa

Claro que todas as nossas expectativas não seriam atendidas, como já mencionei são muitas corridas e acontecimentos, a série não tem todo esse peso documental. Mas algo que queríamos ver é como o acidente de Romain Grosjean seria retratado. As imagens fortes da sua batida foram muito exploradas, mas a Netflix consegue trazer aquele clima de incerteza e medo. Eles focam no tempo de paralização, a intensidade da batida, a eternidade que um acidente assim parece levar, o jogo de câmeras e trilha sonoro proporcionam a sensação.

Romain Grosjean fala sobre o seu acidente – Imagem: reprodução

 

Eles usam as falas dos chefes de equipes e pilotos que na Fórmula 1 é muito difícil ver o fogo e por isso que vários sentiram medo com aquelas imagens. Como parte do acidente não foi revelado pela FOM, elas acabam sendo chocantes mesmo já sabendo de todo o desenvolvimento e resultado.

Outro momento de expectativa era a retratação do contrato de Sergio Pérez, eles conseguem abordar este fato mostrando um pouco do brilho do mexicano na temporada, mas focado principalmente nas suas últimas provas. O desejo de muitos era que Pérez retornasse para o grid em 2021, pois após trabalhar tão fortemente em 2020 seria um desperdício o piloto não ter um assento em alguma equipe.

O sobe e desce de Pierre Gasly é relatado, mas a sua ascensão na AlphaTauri também precisa ser documentada. Este é um dos episódios que entra na minha lista de favoritos na temporada, eles narram a vitória do piloto, mostra como ela se deu, mas antes disso volta a apresentar os golpes sofridos pelo francês como a perda do amigo Anthoine Hubert e toda a reconstrução da sua confiança.

Dez times no grid?

Os bastidores voltam a aparecer mais uma vez com a Netflix, eles aproveitam para se aprofundar um pouco na Alfa Romeo e na sua disputa de fim de grid com a Haas, mas também entender quem são os pilotos que defendem este time. A equipe quase não tem tela nas outras temporadas, mas foi explorada desta vez.

O sétimo episódio é um dos que eu mais gostei, pois me lembra muito o que foi feito na primeira temporada de DTS – dá qual gosto muito, onde bastidores e conflitos de pista se dividiam em tempo de tela para contar uma história dos ‘’principais’’ naqueles minutos preciosos.

No entanto nesta temporada a Netflix não explorou a venda da Williams, ou o fato de Claire Williams ter deixado o time após o GP de Monza – aquela corrida que muita coisa aconteceu. A equipe já tinha sido abordada em outros momentos pelos problemas que passava no grid, mas este capítulo da história deles foi deixado de lado.

Veredito sobre a terceira temporada

Acho que a construção da série deixou algumas pontas abertas, por abordar um esporte onde já sabemos o resultado, mas também existem momentos em que o suspense é desnecessário, assim como a ocultação de resultados.

Em alguns episódios mais longos, destinados a alguns personagens onde muitas imagens de corridas e treinos livres foram usados e eles eram interferidos com falas sobre aqueles acontecimentos, dava a sensação de um highlight mais bem elaborado sobre o fim de semana.

Gostei da terceira temporada e do fato deles trazerem novos personagens, contarem algumas histórias que estávamos sedentos por saber mais. Por fim é uma série que faz a gente se lembrar de alguns momentos, mas para quem já acompanha a F1, vê claramente que muita coisa é montada para dar a aparência que aconteceu daquela forma, um mecanismo importante para atrair mais espectadores para a categoria – a geração de conflitos, mas não agrada muito quem gosta da F1. 

Ao que tudo indica a quarta temporada já está sendo filmada, com a Netflix já acompanhando os times nos testes de pré-temporada que foram realizados no Bahrein. Novas histórias estão por vir!

LEIA MAIS: O Veredito: Drive to Survive 2

Devaneios sobre: Fórmula 1: Dirigir para Viver

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Debora Almeida

Jornalista, escrevo sobre automobilismo desde 2012. Como fotógrafa gosto de fazer fotos de corridas e explorar os detalhes deste mundo, dando uma outra abordagem nas minhas fotografias. Livros são a minha grande paixão, sempre estou com uma leitura em andamento. Devoro séries seja relacionada a velocidade ou ficção cientifica.

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